Manel, levanta-te da cama!; Oh mãe deixe-me dormir…; Manel,
levanta-te que perdes o emprego; Oh mãe que se lixe o emprego; Mas filho, sem
emprego não há dinheiro e sem dinheiro não há pão; Oh mãe, que se lixe o
emprego e o dinheiro. O dia de amanhã há-de ser igual; Como Manel, como? Grita
a mãe. Arranca-lhe a roupa da cama e lembra-se de quando o tirava da cama para
ir para a escola, estremunhado, de quando lhe dizia que era importante estudar
para não acabar na prisão como o pai. O Manel não se lembra, tem outros
fantasmas – a droga, os amigos que desapareceram em rixas, o frio da sala onde
se assustava com os colegas mais velhos e maus que o marcavam de medo e
vergonha.
Noutra cama, noutro quarto, noutra casa, noutro bairro,
Luísa acorda assustada com o toque do telefone. Dormiu pouco, acordada pela
ausência do filho que tentou contactar toda a noite. Onde anda? Como estará?
Atende o telefone inquieta e a voz da senhora pergunta-lhe: é a mãe do João
Maria? Sim, responde. O que aconteceu? Está internado no hospital, consequência
de um acidente. Está vivo? Pergunta sem coragem… Está… responde-lhe a senhora
da voz que se apaga a seguir… mas por pouco tempo, pensa. Coitada, mais uma a
chorar para toda a vida.